quinta-feira, 1 de março de 2012

Uma experiência com o uso de telefones celulares em classe

Minha experiência com o uso de telefones celulares em classe

A quase totalidade dos meus alunos possui telefones celulares e uma porcentagem considerável possui smartphones.
Em minhas aulas os alunos podem e devem trazer o telefone celular e usá-los dentro dos limites e regras que são discutidos, explicados e acordados logo no início do ano. Eu optei por permitir e estimular o uso pedagógico dos telefones celulares nas minhas aulas pelos seguintes motivos:
  • A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, para qual trabalho como professor, não possui condições para prover a escola de recursos materiais em quantidade suficiente para atender todos os meus alunos e, em contrapartida, a quase totalidade deles dispõe dos seguintes recursos próprios em seus telefones celulares:
    • calculadora;
    • agenda eletrônica;
    • bloco de anotações;
    • câmera fotográfica digital;
    • filmadora digital;
    • gravador de áudio digital;
    • acesso à internet;
    • dispositivo digital de reprodução multimídia (sons, imagens, filmes e animações);
  • Eu tenho um compromisso com a qualidade do ensino oferecido aos meus alunos que não me permite abrir mão de todos esses recursos oferecidos pelos telefones celulares;
  • O uso dos telefones celulares pelos meus alunos favorece sua aprendizagem permitindo práticas, dinâmicas e atividades que seriam inviáveis sem eles. Além disso, o uso dos celulares melhora a produtividade da aula permitindo ganhos de tempo e qualidade da aprendizagem;
  • Entendo que é parte do meu ofício como professor orientar meus alunos quanto aos bons usos do telefone celular de maneira a permitir-lhes que exercitem esse bom uso em atividades escolares cotidianas para que, por extensão, também o façam fora dos limites da escola (no seu trabalho, na sua casa e em diferentes meios de convívio). E eu não poderia fazer isso de forma efetiva sem que eles usassem os telefones celulares em minhas aulas.
Meus alunos usam telefones celulares regularmente para:
  • fazer contas usando a calculadora;
  • agendar tarefas e provas na agenda do celular;
  • fotografar as minha lousas (eu sugiro esse método, ao invés da cópia da lousa no caderno, porque são alunos do Ensino Médio, porque isso garante maior fidelidade da informação, porque isso é uma atividade sustentável que evita o uso de papel e porque o celular permite armazenar as lousas do ano todo em parte insignificante de sua memória). Eu mesmo fotografo minhas lousas para ter o registro exato do que foi trabalhado em cada classe;
  • fotografar materiais didáticos indisponíveis para toda a classe, como páginas de um dado livro que a escola não dispõe para a classe toda;
  • registrar por meio de filmes e imagens as atividades práticas no laboratório ou fora da sala de aula;
  • desenvolver atividades no laboratório ou fora da sala de aula usando recursos de multimídia e outros disponíveis no celular (áudios/entrevistas, vídeos, imagens, apresentações, calculadora, cronômetro, etc.)
  • pesquisar conteúdos na internet (para os que têm smartphones);
  • usar como fonte de material de consulta em “provas com consulta” (podendo usar o conteúdo da memória do celular ou o obtido via internet ou redes sociais).
Meus alunos não usam o telefone celular em classe para:
  • fazer ou receber ligações na sala de aula (isso eles podem fazer quando saem para ir ao banheiro);
  • jogar videogame, assistir vídeos, ouvir música, participar de redes sociais, navegar pela internet ou fazer qualquer outro uso que não tenha sido explicitamente solicitado por mim como parte de alguma atividade pedagógica;
  • produzir qualquer tipo de material (áudio, imagem, vídeo, etc.) não solicitado explicitamente por mim;
  • participar de redes sociais ou manter comunicações com outras pessoas, exceto quando isso faz parte de uma atividade e foi solicitado por mim.
Além disso:
  • Procuro orientar meus alunos sobre o uso seguro dos celulares e da internet de forma geral;
  • Discuto com meus alunos questões envolvendo ética, direitos autorais e violação dos direitos privados dos colegas;
  • Oriento-os a estabelecerem contratos de uso dos celulares com todos os demais professores, esclarecendo que cabe a cada professor determinar a forma como os telefones celulares podem ou não ser usados em suas aulas.
O número de vezes que tenho que intervir para garantir o uso correto dos celulares cai progressivamente ao longo do ano nas classes dos primeiros colegiais e é mínimo nas classes onde os alunos já me conhecem.
Nunca houve nenhum caso de mau uso do celular onde as sanções precisassem passar do nível da advertência verbal e discreta.
Os relatos de experiências de professores com os quais tenho contato em projetos que participo, nas redes sociais e em oficinas de formação onde atuo como formador dão conta de resultados bem parecidos com os meus. Logo, não apenas a “teoria” sobre o uso pedagógico do telefone celular, como também a prática, têm mostrado que é possível, viável e recomendável que ele seja usado cada vez mais em nossas aulas.
Finalmente, aos professores que imaginam que proibir o uso do telefone celular por meio de leis, ou da proibição do aluno levá-lo à escola, poderá ser um meio “mais fácil” de lidar com o problema do seu mau uso, eu deixo aqui uma pergunta bastante razoável: não seria mais “profissional” da parte do professor educar ao invés de proibir?
Referências na internet:
(*) Para citar esse artigo (ABNT, NBR 6023):
ANTONIO, José Carlos. TICs, telefones celulares e a escolassaura, Professor Digital, SBO, 30 jan. 2012. Disponível em: <http://professordigital.wordpress.com/2012/01/30/tics-telefones-celulares-e-a-escolassaura/>

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Redes sociais na escola

Com as redes sociais, aulas vão muito além das salas

A internet, antes restrita a momentos de lazer, passa a ser usada para transmitir conteúdo a alunos

Carla Nascimento
foto: Carlos Alberto Silva
Valquiria Cuin Borges é professora do curso de Fisioterapia da Emescam. Ela costuma usar o Facebook como ferramenta didática no curso - Editoria: Cidades - Foto: Carlos Alberto Silva
Com uma conta no Facebook, a professora Valquíria Borges ajuda alunos do curso de Fisioterapia da Emescam
Onde se aprende mais: na sala de aula ou no computador? Alguns anos atrás essa pergunta ofenderia qualquer educador. Hoje, há quem enxergue no ambiente virtual uma nova ferramenta de ensino, tão importante quanto a educação formal. A diferença concentra-se sobretudo na metodologia.

Dentro dos muros de uma instituição as informações fluem de forma organizada, sistemática e com roteiro pré-definido. Nas redes sociais, elas chegam por todos os lados, e o número de "professores" se multiplica.

A internet, antes território restrito aos momentos de lazer, passa a ser usada para transmitir conteúdo, complementar o que é dito em sala de aula e tirar dúvidas dos estudantes. Há iniciativas tanto em escolas de educação básica quanto no ensino superior.

Mais interação
A professora Valquíria Cuin Borges usa o Facebook para ensinar. Com uma colega de trabalho, administra uma conta na rede social para ajudar os alunos do curso de Fisioterapia da Emescam a entenderem melhor conceitos práticos. Além de eventos da área, ela inclui relatos de atendimentos a pacientes feitos por alunos de períodos mais avançados. As experiências são abertas a todos. No Facebook, os estudantes podem debater o assunto e tirar dúvidas. "Facilita muito", diz Valquíria.

A orientadora técnica educacional do portal Planeta Educação, Karen Andrade, avalia como positiva e necessária a utilização das redes sociais no aprendizado. Para ela, o papel do professor, nesse caso, não se limita a transmitir informação. Ele também deve orientar o aluno sobre a melhor forma de aproveitar os recursos disponíveis na internet. "As redes sociais ajudam a direcionar a aula e permitem que o professor conheça melhor o aluno", diz.

A Faculdade Univix, por exemplo, possui uma comunidade com mais de mil membros que permite a discussão de assuntos por meio de fóruns, criados por alunos ou professores, visualização de fotos e a participação em bate-papo. O espaço, aberto para até para quem não é aluno da instituição, permite o acesso a informações sobre o conteúdo de todos os cursos.

Na FDV, a informação também é transmitida via web. A instituição possui uma rede social própria, o Observatório FDV. Nela, alunos e professores podem inserir vídeos, notícias e comentários em um modelo semelhante ao Facebook.

Professor tem 3 perfis, site e 106 mil seguidores
O professor de Direito Alexandre Mazza é mais do que um educador. Entre os alunos é uma celebridade. Com três perfis no Facebook, site próprio, mais de 106 mil seguidores no Twitter e uma espécie de fã-clube no microblog, ele achou a fórmula que une educação e lazer.

Nesse campo ele é autodidata. Foi errando e acertando que encontrou o ponto ideal entre os momentos de bater-papo e apresentar o conteúdo. "Percebi que nenhum professor usava o Twitter de forma profissional. Então, resolvi postar algumas dicas para o exame da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil)", conta.

Mazza afirma que a iniciativa foi "um sucesso". "Comecei a crescer. Como fui pioneiro nessas coisas, aprendi que não posso postar tudo o que faço ao longo do dia, até para me preservar. Hoje, trabalho com muito conteúdo, mas não deixo de falar de algumas coisas pessoais, sempre respeitando o limite entre o espaço privado e público", diz.

Novidades
Segundo ele, não há roteiro. Professor de cursos preparatórios para concursos, ele informa sobre novidades na legislação e indica links úteis aos estudantes. Em véspera de grandes seleções, faz revisões online. O conteúdo complementar é disponibilizado em um site próprio, criado há cerca de sete anos, cinco anos antes da conta no Twitter.

"A internet obriga a ser mais objetivo e direto com a informação. Percebi que o público que se acostumou com as redes sociais não aceita mais uma linguagem diferente. Acredito que, aos poucos, a linguagem da internet vai mudar a linguagem usada em sala de aula", opina.

Quem não tem rede vai de site...
Nem todas as instituições se sentem seguras para utilizar as redes sociais como ferramenta de ensino. Mas nem por isso precisam ficar longe do mundo digital. Sites, blogs e até e-mails de grupo ainda desempenham um grande papel nas escolas.

No Centro Educacional Leonardo da Vinci, o blog do ensino médio tem 1,5 mil acessos por mês, em média. De acordo com o professor de Física, João Duarte, o espaço serve para motivar a discussão sobre algum assunto ou enriquecer o que foi dito em sala de aula. A página na internet ainda recebe artigos sobre temas relacionados com o conteúdo.

O site do UP possui um espaço para os alunos conferirem simulados e blogs de alguns professores.

Na escola Crescer PHD, cada turma de ensino médio tem seu e-mail. Por meio dele, professores encaminham textos e materiais entregues em sala de aula. Além disso, essa é a oportunidade que as famílias dos alunos têm de acompanhar as aulas, pois todos os pais têm a senha de acesso.

Redes viram ferramenta de tira-dúvidas

No Twitter, o professor Murilo Goes é pura descontração, como a maioria das pessoas que usam as redes sociais. Mas mesmo ali, no ambiente virtual, sabe de sua responsabilidade. "Meu principal foco é desfazer a barreira, o tabu, que existe entre professor e aluno. Sei que o professor é um modelo. Dou aulas de Português e não posso cometer erros no texto, mesmo a internet sendo um ambiente mais flexível." Segundo ele, alguns alunos já acessaram o microblog para tirar dúvidas. "Às vezes eles querem respostas imediatas. O Twitter e o Facebook permitem isso", explica o professor, que tem cerca de 800 alunos do 1º e 2º ano do ensino médio e uma conta de e-mail só para responder a perguntas de estudantes.

Opinião de especialista
"É preciso saber como usar as redes sociais"

Para o educador Cláudio de Moura e Castro, as instituições de ensino ainda estão no "zero" quando o assunto é a utilização de redes sociais. Com exceção de ações isoladas, ainda há muito o que avançar no aproveitamento do potencial da internet. O economista, escritor, mestre em Educação e colunista da revista Veja não acredita que as redes sociais, sozinhas, tenham a capacidade de aumentar o interesse do jovem pela escola, mas defende que elas façam parte de um processo de evolução.

Como as redes sociais são usadas na Educação?
De forma estruturada para ajudar na Educação, estamos no zero. Mas o potencial é muito grande. Podem haver experimentos interessantes que desconheço, mas de modo geral não há nada estruturado.

O que falta?
O potencial (das redes sociais) é grande, mas é preciso saber como elas serão usadas. Não é automático. Usar para fazer o quê? Há várias tentativas de colocar questões e provas no Twitter, as coisas estão começando a acontecer. Mas mesmo nos Estados Unidos não existe uma linha de produção. Nesse ponto a Educação é muito atrasada.

Mas há iniciativas de alguns professores ...
Esse é o caminho mais fácil, digamos. A linha mais ambiciosa é começar a ter lição, prova no Twitter.

As redes sociais podem aumentar o interesse do jovem na escola?
Sozinhas, não. Currículo excessivo e material chato, na sala de aula ou no Twitter, é a mesma coisa. É como colocar uma matéria chata, de decoreba, no computador. Ela vai continuar chata. Se é para tornar o ensino interessante, o Twitter pode ser parte da solução. Mas a escola tem que se tornar mais interessante.

Como as redes influenciam na Educação?
Há um aspecto importante, que não está bem estudado: é o papel das redes sociais em aproximar a escola do aluno, mas aí não é uma mudança cognitiva. É simplesmente afetivo, emocional. O aluno que se comunica com a escola por Twitter se sente mais perto da instituição, e isso é bom.

Como os educadores devem separar o pessoal do profissional na internet?
Aos poucos é possível desenvolver uma etiqueta para lidar com isso. Antes as pessoas não sabiam lidar com celular: falavam na hora que não podia... Dez ou 15 anos depois, esse conflito não é mais o mesmo. O professor que coloca todas as inconfidências num clique está se expondo. Ele tem que ouvir de um amigo que não deve ou perder uma vaga no emprego para aprender.

"A rede promove a aprendizagem conduzida pelos estudantes. Eles aprendem com o professor, aprendem entre si, ensinam uns aos outros e até podem ensinar aos professores", Bruno Costa Teixeira, Professor de Direito Digital da FDV

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